sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A roupa (já morfológica) da nossa criação

Com os pais entregues às lides rurais exigidas por uma quinta como a nossa, as crianças ali nascidas eram criadas ao ritmo e nas condições possíveis para as circunstâncias.
Quando ainda na amamentação, estas tinham de acompanhar os pais para os campos e ali permanecer ao longo do dia, se fosse esse o período de trabalho, só regressando a casa quando os pais regressavam.
Dentro duma canasta ou de um cesto de verga, que lhes servia de berço, estes eram deslocados de sombra para sombra, ao ritmo que o trabalho impunha, estando as crianças sujeitas à picada de todo o tipo de insectos ou à visita dos mais variados animais rastejantes, que abundam pelos campos.
Poder-se-á dizer que era uma criação um pouco ao Deus-dará, mas que tinha a vantagem de criar defesas no organismo, que lhes valiam para a vida.
Quando as crianças já se movimentavam por si próprias, desde muito cedo se tornavam autónomas quanto à satisfação das suas necessidades fisiológicas, por exemplo, pois a questão do lugar nunca se levantava – todo o sítio era adequado, tudo era campo.
O problema da limpeza gerado pelo acto, também se resolvia por si mesmo - não se limpava na hora. Depois se veria …!
Era então que as mães procuravam atenuar esse problema, criando o que hoje se designa de roupa morfológica - adaptada ao corpo. E se o corpo tem aberturas, a roupa também as tinha.
Foi assim, que me lembro de usar um macacão justo ao corpo, com abertura por entre as pernas, desde o meio da barriga até atrás, ao meio das nádegas.
Se andávamos de pé esta quase não se notava, mas se nos colocávamos de cócoras, a abertura deixava-nos prontos para quaisquer necessidades. Era a funcionalidade da roupa a prevenir quaisquer acidentes.
Mas a abertura também desfazia dúvidas.
Conta o meu irmão Quim que, quando muito pequeno, a nossa mãe lhe deixou crescer o cabelo, ficando com bonitos caracóis.
Um dia estava sentado sobre o muro à beira da estrada, quando a mulher de um casal que passava, disse:- ai que linda menina !
Mas logo o homem a corrigiu, dizendo:- tu não vês que tem penderica, é um garoto !
A abertura do macacão que tinha vestido, desfez as dúvidas.

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