quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

11. A sesta

Não tendo já a noção exacta de como eram as temperaturas na altura, do que não resta dúvida é que as quatro estações do ano se identificavam perfeitamente no seu momento próprio.
E havia um hábito que no verão a nossa mãe procurava fazer cumprir com rigor, enquanto pequenos – dormir a sesta.
Porém, nem sempre isso era cumprido, quando o sono demorava a chegar.
Antes de ocupar a cama para a presumível sesta, deixava-se uma porta destrancada para não haver barulho no momento da escapadela.
Aguardava-se que o sossego tomasse conta da casa, o que significava que todos estariam a dormir e procurava-se a forma de ocupar o tempo fora de casa.
Numa dessas escapadelas e com um calor abrasador, dirigi-me através dos regos do trigo até à ribeira, ao fundo da quinta.
Ao passar junto a uma velha oliveira na ponta do cômoro do meio, oiço um pequeno silvo ou assobio, como se do alto da oliveira alguém me chamasse.
Levanto a cabeça para cima e quase ia morrendo de terror, quando ao nível da cara deparo com uma grande cobra dependurada da oliveira, com a sua cabeça mesmo à frente dos meus olhos.
Numa gritaria, que deitou por terra a artimanha para não fazer a sesta, corri para casa a comunicar o caso e a pedir socorro.
No trajecto fui caindo e esfolando os joelhos, precisamente no sítio onde algumas verrugas foram sendo limpas com a esfoladela que a queda tinha provocado.
Dizia-se que das verrugas não podia haver derramamento de sangue, pois iriam gerar mais verrugas, mas a verdade é que aquelas foram limpas e no sítio não surgiram outras.
De casa veio então um irmão mais velho com um podão encabado num forte varapau, porque eu dizia que a cobra era muito grande, mas a verdade é que não mais se viu tal bicho.
Resultou então um grande ralhete da mãe, por ter ficado a saber da fuga à sesta, e o aperto das medidas de segurança para que a situação não voltasse a repetir-se.

Sem comentários:

Enviar um comentário