terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Pega (quase) de cernelha

A Quinta do Olival Grande, do outro lado da estrada em frente ao Chão de Alverca, era muito maior do que a nossa quinta.
Mas tinha mais ou menos as mesmas características agrícolas. Só que em maiores quantidades. Quanto a vacas, por exemplo, recordo que havia muitas, embora não saiba quantificá-las.
Enquanto nós tratávamos da quinta pelos nossos próprios meios, eles recorriam a pessoas que trabalhavam à jorna para outros. Tinham, até, uma pessoa a trabalhar a tempo inteiro.
Era o que então se designava de criado, que lá vivia, em regime de disponibilidade as vinte e quatro horas do dia, cuidando essencialmente dos “vivos”, englobando aqui os animais, mas também as árvores, plantações, sementeiras e hortas, que careciam de uma atenção permanente, face à necessidade de serem acomodados, regadas, podadas e colhidas.
Embora muita gente não tenha noção da exigência colocada pela agricultura, importa lembrar que o ciclo de vida de cada uma destas espécies determina cuidados diários, em todos os dias do ano.
Qualquer um dos “vivos” necessita comer todos os dias. Vacas, porcos, cabras, ovelhas, coelhos, galinhas, cães, são alguns desses “vivos”.
Mas as vacas, as cabras e as ovelhas também necessitam ser ordenhadas todos os dias, quando estão em período de aleitação.
E para dar de comer às vacas, por exemplo, é necessário cortar forragem todos os dias, ou então acautelar um dia ou outro, como são os domingos, cortando a forragem de véspera.
Outros terão de ser postos no pasto, como cabras e ovelhas, mas com as devidas precauções, pois não podem ficar à solta.
No Chão de Alverca o compromisso de tratar dos “vivos” era de todos.
E os mais novos sabiam bem que, aos domingos, só podiam ir para a “moina” ou para a “vadiagem”, como às vezes ouvia a meus pais, de uma forma muito depreciativa, quando tivessem cumprido as obrigações para com as tarefas da quinta.
Entretanto, eram frequentes os incidentes com os “vivos”. Ou porque se soltavam e davam cabo da horta, ou porque fugiam dos capoeiros e era preciso fazê-los recolher, ou porque invadiam a propriedade dos vizinhos, onde causavam prejuízo, ou ainda porque devoravam as crias, comiam os ovos, etc. .
Aconteceu na nossa quinta, mas também aconteceu na Quinta do Olival Grande – um dia, uma vaca fugiu !
Da fuga da vaca no Chão de Alverca, só me lembro de ouvir falar, mas na do Olival Grande aí fui um dos intervenientes no episódio da tentativa de a fazer recolher ao estábulo.
Veio para a estrada e alguém começou a gritar por ajuda.
Também acorri e, juntamente com outros vizinhos, tentei que a vaca retomasse o caminho da quinta, mas ainda era preciso prendê-la.
Foi então que corri atrás da vaca e segurei-a pelo rabo, sendo rebocado por ela, com os pés a escorregar sobre a terra do caminho, como se estivesse a esquiar.
De tanto correr, levando-me a reboque, a vaca acabou por cansar-se e parar, permitindo que alguém lhe atasse uma corda ao pescoço e a levasse para o estábulo.
A intenção foi imobilizar a vaca e isso foi conseguido.
Fiz, então, o papel de rabejador, só faltando no lado da vaca o cernelheiro, a segurar, para que tivesse sido uma verdadeira “pega de cernelha”.

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